Fritz Walter e sua desventura
Aproveitando da friaca que fomos acometidos neste início do mês de julho, onde os termômetros registraram temperaturas, em diversas localidades, quase a zero grau em São Lourenço, MG, e adjacências, aliás, coisa que a muito não ocorria, me trouxe a lembrança um episódio narrado pelo meu saudoso pai, Luiz Ayres, quando nos idos de 30, presenciou uma cena que na ocasião, foi motivo de grande tensão junto aqueles que ali participaram do inconsequente momento, que por pouco não causou uma tragédia, em que o estúpido alemão, querendo se “mostrar” aos colegas caixeiros viajantes, se submeteu a entrar debaixo do chuveiro,- naquela ocasião não existia chuveiro elétrico, a não ser por serpentinas que passavam pelo fogão a lenha aquecendo a água em caixas de metal a mantê-la sempre quente para utilização – no início da madrugada, onde segundo o termômetro do hotel em que se encontravam, registrava, na cidade de Maria da Fé, MG, menos 2 graus negativos. Como adendo a este registro, Maria da Fé naquela oportunidade, era uma das mais frias cidades brasileiras e a mais fria de Minas Gerais.
O grupo que normalmente após o jantar, costumava se reunir a prosear na praça da estação a contar suas bravatas, suas fanfarronices, e outras tantas falácias, inclusive amorosas e “dom juanescas”, entre bebidas fortes visando amainar o frio reinante, em que a aguardente era o” cobertor”, além das roupas de lã, poncho entre outras alternativas, como fogueira improvisadas em latões com carvão a aquecer a roda que papeavam.
Nisso, de súbito chega-se ao grupo, Fritz Walter, a retirar seu chapéu enterrado à cabeça até as orelhas, e pede ao copeiro do bar uma garrafa de aguardente. Atendido, vira se ao grupo, sem antes dizer que era pra refrescar, pondo goela a baixo o líquido solicitado quase até meia garrafa. Arrotando a bebida, disse que hoje estava muito esfogueado e nada melhor que um banho para acalmá-lo. Um dos amigos ali presente, virando-se ao alemão, indaga se ele teria coragem de encarar uma chuveirada àquela hora da noite , em que a água da caixa metálica já era bem fria.
Luiz, que o ajudava no início da profissão de caixeiro viajante, junto seus amigos e clientes, o apresentando como pessoa de boa índole, trabalhador correto nas suas atitudes comerciais, enfim cidadão altamente confiável, representante da Cia. Mirtha Industrial do Rio de janeiro, famosa pelos produtos de toucador, como; o sabonete, talco, perfurarias e outros , da linha EUCALOL, que estava iniciando suas linhas de produções pelo Brasil afora, ampliando sua divulgação. Luiz amigo e conhecendo as artimanhas de Fritz Walter e, portanto, ser um alemão tinhoso, conhecido pelas fanfarronices expostas, entrou no circuito não aprovando a atitude em banhar-se, só para dizer que em nada o temia, muito menos ter medo de agua gelada, onde na Alemanha, cuja temperatura em Hamburgo chegava a menos dez graus negativos e nunca deixou de tomar diariamente seus banhos.
Nestas alturas, os colegas ali reunidos em volta do tonel onde ardia uma fogueira a aquecê-los, pois a friagem passava dos -2,5 °, depois de esvaziar a garrafa de aguardente, saiu em direção ao banheiro do hotel, a solicitar uma toalha a gerência, pegar um sabonete EUCALOL, acompanhado do grupo que insistia naquela loucura, inclusive seu amigo Luiz, que era contra aquele absurdo, e junto a porta aberta do chuveiro, após se despir, só mantendo a ceroula, se pôs a abrir a torneira, que em princípio não saiu agua, pois congelara no cano de ferro. Batendo no cano com cabo de uma vassoura, aos pouco a agua começa a sair pelo chuveiro e foi aumentando de volume e finalmente Fritz penetra debaixo daquela maldita ideia.
Esfregando a cabeça com as mãos em que o sabonete entra em ação, urrando logicamente pelo frio, a saltar em pulos frenéticos, apoia-se à torneira, vai vergando as pernas e se deixa cair ao chão do box sobre os olhos dos presentes espantados, quando Luiz penetra e o mais depressa fecha a agua da torneira. E com auxilio de dois colegas, o envolve nas duas tolhas. Com respiração ofegante, como houvesse participado de uma corrida, de olhos semiabertos, mãos roxeadas como os lábios e ourelas, é conduzido ao quarto, posto à cama e coberto por três cobertores, depois de vestido com suéter camisas de flanelas e meias de lã.
Com ajuda do hoteleiro, ministraram- lhe canecas de chá de capim limão, e agora aquecido com o corpo já dando sinais de recuperação, Fritz Walter caiu em sono profundo, naturalmente pelo litro de aguardente ingerido antes da loucura efetuada. Mesmo assim, Luiz solicitou na presença de um médico, o que veio a ocorrer já passando de meia noite. Mas o recomendava sua presença no seu consultório na manhã seguinte.
Moral da história: O bucéfalo do alemão, depois desta refrega com a saúde, foi acometido de uma Broncopneumonia, e teve de permanecer três dias internado na Santa Casa local. Mas uma coisa serviu de lição, depois da bronca que levou do amigo Luiz, que ainda o ajudou nas suas vendas visitando os fregueses enquanto se recuperava da besteira que praticou... Fritz Walter tornou-se daquele dia em diante, seu melhor companheiro e amigo, mesmo depois de Luiz deixar a profissão e ter seu comércio de Laticínio no Rio de Janeiro, em que era visitado sempre que o alemão aqui estava, a presenteá-lo com os produtos EUCALOL.
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