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Sexta-feira, 11 de Outubro de 2024
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Levi e seu dia de cão

O melhor amigo não se foi

José Luiz Ayres
Por José Luiz Ayres
Levi e seu dia de cão
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Como sempre lá estava eu na estação ferroviária de São Lourenço àquela manhã de sábado, a prosear e curtir com alguns amigos a movimentação de turistas que se aglomerava a circular entre o saguão e a plataforma, onde o Trem das Águas aguardava a hora da partida. De repente, um cão surge em meio às pessoas na plataforma. Com o assobio característico ao chamamento de cães, um senhor postado á porta de acesso, próximo a nós, virando-se a mim, teceu comentários preocupantes, após o animal não atendê-lo e se esgueirar por entre as pernas dos transeuntes e desaparecer sob o vagão. Sua apreensão deveu-se, a algum possível obstáculo ou mesmo às ferragens dos trucks das rodas, pois poderia se prender, e óbvio seria o seu fim.

Concordando em parte com o comentário, limitei-me apenas, menear a cabeça e dizer que o animal saberia, por instinto de preservação, se defender. Mantendo o diálogo, o senhor resolveu contar uma passagem ocorrida na sua infância, a qual nunca se esqueceu ao longo da sua vida. Daí a preocupação com aquele “vira-lata”.

Dizia ele, que aos nove anos de idade, morando na Cidade de Andrade Pinto (RJ), e por ser a localidade, na época, local desprovido de recursos, se via na obrigação de percorrer diariamente alguns quilômetros até ao grupo escolar. Toda manhã por volta das 06 horas, conduzindo suas sacolas: uma com material escolar e a outra com a merenda, apeava o leito da ferrovia em direção a Paraíba do Sul. Esta caminhada era sempre acompanhada pelo seu cão de nome Reco, que na escola o aguardava no pátio de recreio até o término das aulas ás 12 horas, onde pegava a via de retorno a casa.

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Numa ocasião, Levi conforme se identificou, retornava e como de hábito alegre caminhando, soltava seu amigo Reco da correia que o prendia à coleira, a fim de que pudesse em liberdade, participar das brincadeiras durante o exaustivo e maçante percurso. Entre carinhos, afagos e esconde-esconde atrás das touceiras de capim limão, margeante ao leito ferroviário, ao acoitar-se numa das moitas, deparou-se com uma cobra. Apavorado, gritando ao afastar-se, Reco se chega e salta sobre ele ao encontrá-lo. Nesse momento a víbora se sentido, talvez atacada, se lança em bote sobre eles, cujo cão como um escudo protege Levi, que desesperado sai em disparada sobre os trilhos. Mais adiante, ao voltar-se, vê o animal caído sobre os trilhos tentando erguer-se. Tomado pelo pavor, chorando se aproximou do amigo, sem antes ao redor, observar a ausência da cobra. Ao abaixar-se, observa que a coleira estava presa na junção da emenda dos trilhos. Esforçando-se para removê-la, com grande dificuldade, pois Reco agitado e ganindo dificultava ainda mais a sua remoção, entra em desespero ao ouvir o apito do trem. Ao erguer a cabeça, observa ao longe no início da reta, o ponto negro oscilante expelindo vapor e fumaça. Em pânico, desesperado, tenta em vão arrancar de qualquer maneira a coleira que enganchada ao trilho cada vez mais fica difícil para uma criança sacá-la. Deixando Reco que se debatia, sai a correr sobre a linha na direção do trem, a gesticular e saltar com a finalidade de chamar a atenção do maquinista. Á medida que o trem se aproximava, o apito insistente passou a ecoar. Levi sentindo que o trem não pararia, deixou os trilhos sem antes dar o último olhar ao seu amigo que se debatia e gania e, á margem do leito, cobriu o rosto em choro convulsivo deitando-se ao chão. Não demorou o barulho, o calor e o vapor da Maria Fumaça e os vagões passam ao lado. Sem coragem para erguer-se, inerte e chorando permaneceu deitado.

De súbito, uma voz seguida de um afago em sua cabeça, alguém fala: - Filho, pode se levantar, seu cachorro está aqui, segure-o!
Abrindo os olhos, ainda sem conter a convulsão pelo choro, vê seu amigo nos braços do homem, que lhe entrega e o abraçou comprimindo ao seu peito, a estampar um largo sorriso.

Na cabine da locomotiva do cargueiro, após contar como tudo aconteceu ao maquinista e o homem verificar que o cão não foi mordido pela víbora, já que não havia sinais; tanto externo como de debilidade do animal, que caracterizasse a evolução positiva da peçonha, chamou atenção, entretanto, um detalhe. A marca dos dentes da serpente estava gravada na coleira de Reco. Portanto, a coleira que o salvou foi a mesma que quase matou seu amigo fiel.

A bordo da Maria Fumaça, lá se foram Levi e seu amigo, de carona, após o menino ter o seu dia de cão!

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