O achado sob suspeição
Edgard, um simpático aposentado delegado de polícia, que também faz parte da nossa coletânea de episódios, onde o trem tornou-se inconteste nas suas incursões à busca do cumprimento da lei, a solucionar casos intrincados policialescos, lembro-me que entre inúmeros episódios por ele narrados, um fato, segundo revelou, o causou bastante preocupação, a deixá-lo várias noites sem dormir e dias desorientado a se sentir incapaz como um safo e inteligente agente de polícia ou detetive.
Designado à missão em comparecer a estação ferroviária de Lavras, MG, dada a solicitação do chefe da estação cuja ocorrência dizia respeito a uma mala misteriosa deixada por um cidadão; que ali esteve a dizer que seria entregue ao tal de Augusto, que chegaria pelo expresso das 16 horas. Mas devido a não poder aguardá-lo, procurou o agente ferroviário, que se prontificou a entregá-la, mantendo-a sob custódia a um canto na plataforma.
O expresso chegou, partiu, com a movimentação natural ocorrendo e ninguém se apresentou e muito menos o tal Augusto, dito interessado pela mala. Preocupado, após aguardar algum tempo, com a plataforma já deserta, o agente dirigiu-se a administração conduzindo a pesada mala, onde cientificando ao chefe do problema, teve a autorização em deixá-la sob os cuidados da chefia. Porém, os dias foram se sucedendo e se quer alguém procurou para reclamá-la. O que obrigou ao chefe da estação solicitar ajuda da polícia, pois aquela mala estava causando certa apreensão. Afinal providências tinham de ser tomadas e as autoridades policias seria o certo. Diante disso, Edgard lá chegando, sem tocá-la, a examinou parcialmente, fez as perguntas de praxe e resolveu empunhar a alça onde constatou o peso fora dos padrões normais. Deitando-a, tentou abri-la, mas mostrava-se trancada. Na presença do chefe da estação e do agente incumbido do repasse da mala ao dito Augusto, no que rompeu a tranca, ao elevar a tampa, se surpreendeu e apavorou-se ao ver que havia uma ossada humana em meio ao barro em que as peças eram parcialmente envolvidas.
O agente, apoiando-se a mesa, empalideceu após benzer-se a balbuciar algo inaudível. O chefe com o semblante horrorizado tendo a mão na testa, interrogativo profere: É um crime seu Edgard? Fechando a mala, Edgard nada diz, sai e vai à delegacia no intuito de comunicar o achado macabro ao delegado, onde providências legais seriam tomadas em transportar a mala e lavrar o auto para a abertura do inquérito.
Dias depois, Edgard é surpreendido com a presença do espavorido agente ferroviário, a dizer que o homem da mala foi por ele reconhecido e estava na estação com o chefe aguardando. Lá chegando, cheio de autoridade, passou a interrogá-lo, - um simplório cidadão, humilde de fala mansa bem caracterizada de interiorano – a dizer que transportou a mala apenas em troca de uns bons trocados e nunca ter visto o homem; que tinha seu carro quebrado na estrada, dizendo que a mala teria de ser entregue ao seu amigo Augusto que viajava no expresso das 16 horas. Como não sabia se consertaria o carro a tempo de chegar à estação, o pagou para assim fazer. Como era um pouco pesada, a colocou sobre a cabeça, e pôs-se a caminhar. Mas ao tomar conhecimento por Edgard que transportara uma ossada humana, apavorou-se com medo de ser castigado por Deus e ter sua vida atrasada daquele dia em diante.
Claro que o pobre homem falava a verdade, o que fez Edgard pela vivência e experiência de um “tira”, admitir que simplesmente fora usado. Portanto, o liberou de qualquer suspeita. Afinal casos misteriosos como esse volta e meia surgiam nas ferrovias. A maior parte era desvendada, pois se tratavam de exumações havidas, mormente em cemitérios clandestinos em fazendas, cujos proprietários utilizavam-se desta prática mórbida a livrarem-se das ossadas, muitas vezes de escravos e serviçais que lá trabalharam.
Para Edgard, conforme confessou, foi à primeira vez que se deparou com um caso desses, o que o deixou bem desatinado. Mas a experiência do perito criminal o tranqüilizou, ao dar a informação sobre esses casos em que os fazendeiros procuravam livrar-se desses achados macabros pelas ferrovias
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