Um comprador de Bondes, Uai...
Em décadas passadas, era comum entre os “urbanoides” oriundos das cidades ditas como grandes, no caso as capitais notadamente, fazer chacotas e mesmo gozações com nossos irmãos interioranos, por se considerar mais cultos, civilizados e inteligentes pelo grau de adiantamento urbano que possuía, portanto, a atribuir estes qualificativos a nos dar o direito em parodiar sobre eles, é que resolvi narrar expondo pela crônica, um momento bem pitoresco ocorrido em 1950, quando o primo campanhense, Zé Ayres se dispôs tomado pela coragem, nos visitar no Rio de Janeiro, a nos notificar via telegrama sua chegada dia tal.
Àquela época, incrível, mas o telegrama era a via de comunicação mais rápida, pois a telefonia no interior apenas engatinhava à via interurbana e a disponibilidade de utilização requeria um acesso primeiramente às centrais telefônicas, onde as telefonistas nos forneciam o tempo de espera para conclusão da ligação, após contatada a outra central do estado solicitado, para depois então fazer em conexão a ligação, que dependendo da localidade desejada, poderia ser de horas e até mesmo dias, ou mesmo transferir a outra cidade próxima. Falar à Campanha o tempo de espera era de 10 a 12 horas.
No dia previsto a chegada de Zé Ayres, pois por outro telegrama, era confirmado o embarque às 5hs.e20min. de Campanha e chegada ao Rio de Janeiro por volta de 17 horas se tudo andasse perfeito dentro do previsto. Lá foi papai em seu Lincoln Zefir apanhar o querido Zé Ayres, que pela primeira vez conheceria a capital da república.
Eram quase 19 horas, quando papai entra em casa a deixar seu carro à garagem, e nós irmos a direção dele, quando nos surpreendemos na ausência do primo esperado, a dizer que ele não deixou o desembarque e simplesmente não apareceu na plataforma depois de aguardar algum tempo. Mas passava das 23 horas, quando soou o telefone. Atendendo-o, era o primo que falava de Juiz de Fora e não saber que rumo a tomar. Já que a estação estava fechada ao público só abrindo às 15 horas para funcionar. Orientado pelo gerente do hotel, onde passaria o pernoite, disse que trem ao Rio de Janeiro só amanhã às 8,30.hs. Solicitando a possibilidade do telefone, me encaminhou a central telefônica de Juiz de Fora, aonde cheguei e esperei por 2horas e meia para falar, isto por ter a noite o movimento reduzido de ligações.
Papai o orientou a utilizar-se das limusines que fazem este trajeto dai até a Praça Mauá, em pouco mais de quatro horas e operando de hora em hora. Eram 11 horas e 20 minutos, quando finalmente saltou em plena ex-rodoviária Mariano Procópio, Zé Ayres, que deslumbrado ao ver o até então Edifício da Noite com seus 22 andares ali imponente, o Cais de desembarque marítimo em que navios estacionados mostravam-se suas grandezas, se emocionou ainda mais ao ver os bondes conduzindo as pessoas em seus trilhos e pôs-se a narrar sua aventura após embarcar na estação de sua cidade de Campanha ao sul de Minas ao fim daquela madrugada, a despedisse do amigo, Chefe da estação, Seu Paixão, a dizer para tomar cuidado diante da fascinação que a bela cidade nos representa, onde as mulheres bonitas nos fazem virar as cabeças nas belas praias como a de Copacabana, que aos olhos do mundo é conhecida como a princesinha do mar. Ah... Ia me esquecendo, vê quanto custa um bonde e me avisa que mandarei o dinheiro para compra-lo.
Narrando os percalços por ele passados, recorda-se que tudo começou quando ao chegar a cidade de Cruzeiro, (SP) em que é efetuada a baldeação ao expresso Vera Cruz com destino ao Rio de Janeiro, não querendo demonstrar ser um “interiorano”, não quis indagar a plataforma que usaria e resolveu por conta própria optar a uma composição estacionada, onde se intrometeu utilizando de uma das poltronas vagas onde sentou e relaxou, só sentindo a sua partida pelo solavanco da composição deixando a plataforma. Mas não demorou, chega o condutor a solicitar o tique da passagem para picotar. Só que ao verificar, o devolve a dizer que ele estava na composição errada, pois o destino seria Juiz de Fora.
Era necessário baldear na estação de Entre Rios ( hoje Três Rios) e tentar pegar o expresso ao Rio de Janeiro, cujo horário coincide com este que chegaria quase no mesmo horário, desde que não houvesse atraso, pois se perdê-lo, só mesmo amanhã.
Se sentindo um verdadeiro idiota, ou mesmo um interiorano incapaz, por não conhecer nada destas cidades mesmo sendo mineiras. Optou por seguir a Juiz de Fora e de lá entrar em contato com vocês talvez por telefone. Felizmente depois de muito andar pela cidade, consegui um hotelzinho, onde
o dono um mineirinho boa gente, me ajudou orientando a procurar a central telefônica de Juiz de Fora e fiquei no aguardo de duas hora e meia consegui me comunicar com vocês. Só lamento pelas guloseimas trazidas, pois devido a fome que me fustigava me valeram após um copo de leite frio que o dono do hotel me ofereceu, que junto com o queijo e a broa de milho consegui já passando de meia noite me alimentar.
Desculpando-se, prometeu que da próxima vez, seria diferente; ou seja, será um verdadeiro “comprador de bondes” a ter que passar por outra desventura, que Campanha não poderá tomar conhecimento e muito menos o amigo Paixão Chefe da estação, que o havia solicitado comprar um bonde. Após 10 dias entre nós, depois de conhecer todos os pontos turísticos da então cidade Maravilhosa, inclusive o Estádio de Futebol maior do mundo, o famoso Maracanã recém-inaugurado, embarcou no expresso Vera Cruz rumo a Cruzeiro em que será efetuada a baldeação ao sul de Minas no expresso de São Gonçalo do Sapucaí... Só que agora , segundo disse, retornando ao seu “interiorzão” depois de ter seu sonho realizado e não conseguir comprar o bonde...
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