Unidas por traição, aguardam pelo traidor...
Visitando a cidade de Aiuruoca, lá estávamos a curtir as belezas que a natureza nos oferece e bem como o que a localidade em si nos brindava, quando ao chegarmos ao prédio, hoje recuperado, da ex-estação ferroviária, em que tivemos a presença de um cidadão “bem vivido”, que como nós, deslumbra-se com o singelo patrimônio a lamentar pela desativação da malha ferroviária brasileira, notadamente em Minas, onde por vários anos ocupou-se dos trens a serviço da firma de laticínios que operava na colocação dos seus produtos, cuja linha de produção extensa o obrigava tanto ao Rio de Janeiro como São Paulo a viajar a fazer jus ao nome que recebia, ou seja; caixeiro viajante.
Integrando-se a nós, dizia que esta estação o marcou sobremaneira sua juventude, ao presenciar cena inusitada, que até então nunca supôs, na época por volta do final da década de 30, de ocorrer, tal a excentricidade que aquele episódio se desenrolou, vez que casos como aqueles se mostravam raríssimos de acontecer, principalmente, em público, ainda mais numa estação férrea em que o público se aglomerava objetivando o embarque.
Contou-nos que viajando de trem de regresso de Passa Vinte (MG), um pouco antes de chegar a Aiuruoca, uma confusão se instalou no interior do vagão, quando uma mulher aos brados chega-se e começa a agredir uma outra, que alheia sem ter como se defender da agressão e um tanto perplexa, com puxões de cabelos, tapas, chutes e palavras rudes a acusá-la de ordinária, safada, despudorada, entre outras impublicáveis. A agredida, que se surpreendeu pela agressividade, procurou se defender e reagiu engalfiando-se com a agressora também a puxa-lhe o cabelo e socá-la, no que ocasionou à queda de ambas ao chão do corredor em total acirramento, onde gritos também eram ouvidos das duas sem que houvesse qualquer explicação de ambas briguentas.
Perplexos, os passageiros de pé, agitados, assistem a “contenda”, quando alguns homens, entre eles o nosso narrador, tentam apartar a refrega; no que conseguem. A agressora, toda em desalinho, esbravejando, revela que a agredida estava lhe “roubando” o marido, confirmando ao vê-los na estação e pegarem o trem na cidade de Liberdade, onde os seguiu. Só que o safado não estava ali, talvez com medo de ser flagrado. A agredida ao ouvir tal coisa, surpresa, retrucou dizendo ser impossível, pois seu namorado de nome, Nelsinho; a esperava em Aiuruoca. A “chifrada” furiosa, segura pela “turma do deixa disso”, vocifera: - Sua cretina, você sabe que Nelsinho é meu marido! Ao escutar aquela confissão, espantada se põe a chorar e responde: - Então aquele mau caráter é casado? Cretino, miserável, como fui enganada por tanto tempo! Sem mais ter o que dizer, pediu perdão a agressora, propondo que as duas, agora unidas pela traição, dessem uma boa lição naquele canalha à estação de Aiuruoca. Nisso, já com a calma restabelecida, chegam-se o chefe do trem e um agente, que se desculpam pelo retardo, pois estavam ocupados com o problema no último vagão, quando o agente presenciou um “maluco” ou “suicida” lançar-se do trem em movimento, que rolando pelo mato ergueu-se a acenar. Só que o demente deixou à varanda seus documentos caírem, provavelmente ” quando pulou. As “chifradas” ao verem a foto e o nome no registro do tal maluco, se entreolharam e enfurecidas, a suposta amante falou: -- Quando voltarmos, vamos colocá-lo à nossa frente e dar uma surra para que nunca nos esqueça. Aqui nesta estação, aguardaram o trem de volta de Liberdade. Se houve a surra prometida nunca se soube, pois teve seu embarque efetuado e não sabia se as duas enfim conseguiram pegar o dito adulteroso cidadão. Só sabemos, pelo que presenciamos, que o pobre Nelsinho ia apanhar e muito! Já que as duas traídas, uniram-se pela traição e prometiam cumprir a risca suas intenções de repulsa diante do “Dom Juan”.
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